fbpx
Entrelinhas de Mulher

Tênis de bola e outras histórias


Tênis de bola e outras histórias

A rua onde eu moro é um lugar meio mágico. Quando assisti ao filme “Nárnia” entendi que quando eu dobrava a esquina na rua principal para entrar na Rua JMS, estava em um mundo paralelo.

E o que ela tem de diferente? Os moradores! Nesta pequena rua de apenas uma quadra em um bairro calmo e tranquilo, existe um grupo de pessoas que elevam o conceito de vizinho, a outro nível. Aqui, as paredes e os corações são muito próximos uns dos outros.
Nossas crianças nasceram e cresceram juntas, no melhor estilo old times. Andaram de bike na rua, fizeram rampas para acrobacias com tijolos, comeram pipoca com as mãos sujas de barro e pelos de cachorros. Jogaram bola e têm muitas, mas muitas histórias para contar nestes mais de quinze anos de convivência…

A vida também é uma criança serelepe e gosta muito de brincar! Adora o esconde-esconde, o pega-pega e a mãe-fruta! Mas a brincadeira que ela ama, sem sombra de dúvidas, é o ciranda-cirandar! E o dia que ela amanhece com a canção na cabeça… Prepare-se, a vida vai girar, feliz! Ela dá a mão aos amigos amados e dando aquelas gargalhadas altas com a cabeça jogada displicentemente para trás, muda tudo…

E assim, há alguns dias, ficamos sabendo que uma das nossas famílias mudará para Minas Gerais! A tristeza não consegue encontrar muito espaço quando a alegria dá motivos para comemorar! É uma oportunidade maravilinda e eles estarão muito bem! E o que fizemos? Festa, é c.l.a.r.o!

Nesta festa estávamos todos reunidos. Devagarzinho, uma grande roda de conversa se fez e, as nossas crianças, agora adolescentes de várias idades, começaram uma partilha de memórias! Como muitos, além de vizinhos, estudaram na mesma escola, tivemos um poutpourri de aventuras! Histórias simples, cheias de sentido e significado, que narraram tempos felizes da vida de cada um deles.

Rememoram as festas da rua na rua, que tinham direito a churrasco e a banho em piscinas de plástico e de mangueira. Lembraram de como sentiram medo no dia de quebraram um vidro de uma das casas com uma bola, dos campeonatos e corridas, de brincar de esconde-esconde nos terrenos próximos. Falaram dos dias que foram juntos na piscina do clube, sobre correr na grama e sobre uma noite especial no parquinho de um restaurante.

Arquivo da autora

Eles falaram dos amigos da escola, dos professores, de momentos engraçados e inesquecíveis! Um deles disse que, ao fazer um teste de audiometria na escola, na fase da educação infantil, resolver brincar que era surdo e a cada “piiiiii” no fone, ele via a “tia” aumentar o volume, cada vez mais desesperada de estar diante de um aluno “com problema”. Falaram das inúmeras vezes que foram a enfermaria em busca de um chá muito doce de erva doce, de como saiam “se quebrando” da sala para chegarem no campo antes das outras turmas e poderem enfim, serem os reis da bola. Também comentaram como isso dava briga e que, por este motivo, as bolas foram, injustamente banidas do recreio. Revelaram que, para matar a fome de jogar, a cada recreio um par de tênis virava “a bola” e de como o jogo continuou acontecendo. Falaram em como esqueciam as lancheiras, os moletons e as cabeças na escola e sobre como aprenderam que não se deve nem “colar” nem falsificar a assinatura dos pais nas avaliações cuja nota deixou a desejar. Falaram das encrencas nas aulas de educação física e como aprenderam a fazer as pazes. Falaram de “ódios mortais” que duravam uma tarde e de “amores eternos” que com os quais eles falam até hoje. Falaram de amizade, cumplicidade, companheirismo, ética, infância, relacionamento humano e educação.

Arquivo da autora

Acredito que antes de buscarmos a excelência acadêmica e “material”, devemos buscar a excelência humana. Devemos educá-los para serem humanos na melhor e maior acepção da palavra: íntegros, solidários, fraternos, honestos, criativos e livres.

Mas, às vezes, tenho dúvidas, sabe como? Sempre me pergunto: será que estou indo pelo caminho certo? Será que minha crença está certa? Será que eu não deveria exigir supernotas e um superdesempenho? O que está ficando de bom para meus os filhos e filhos de coração? O que eles estão, de fato e direito, levando da vida? O que faz a diferença na formação das nossas crias?

Naquela roda de partilha, ficou mais fácil de entender: não foi a mochila top das galáxias, o caderno caro ou o tênis de rodinha que os ajudou nesta caminhada cheia de alegria! Não foi somente as boas aulas e um conteúdo programático elaborado que trouxe tanta sabedoria. O que fez a diferença foi o tempo que passaram juntos com aqueles que amavam, as experiências que compartilharam, as conexões que estabeleceram – que somados – foram os melhores ensinamentos! A aprendizagem da vida que passou pelo coração!

Foi uma oportunidade de serenar e dizer para mim mesma: tá indo bem Dani! Pode continuar por este caminho! Continue acompanhando o desenvolvimento acadêmico, mas não deixe de valorizar e suprir o desenvolvimento humano!

Arquivo da autora

E sobre meus amigos? Eles partem neste final de semana, deixando muito de si mesmos e levando muito de nós! Ensinaram-nos sobre alegria, amizade e parceria. Para mim ensinaram ainda mais… algo muito delicado e profundo.

Quando soube na partida deste quarteto fantástico, eu fiquei com vontade de chorar. Sozinha, discutia comigo mesma:

– Para com isso, eles estão indo para uma vida melhor!

– É! Mas vai ser a 800 km da gente!

– Não seja egoísta!

– Eu queria que eles ficassem! Quando vou ver as meninas?

De repente, senti duas lágrimas grossas e quentes escorrerem pelo meu rosto e entendi naquele momento porque as lágrimas caem, de lados diferentes! Elas refletem nossas lutas internas: uma de tristeza, outra de alegria. Uma de orgulho e a outra de decepção. Uma de saudade do que foi e outra de saudade do que não será. Uma de amor e a outra também.

Amigos, aqui sempre será o lugar de vocês! A rua continua sendo de vocês! A nossa casa agora é a casa de vocês no Paraná! Deus os guarde, acompanhe e proteja nesta nova caminhada! AmoS vocês!

Um abração,

Dani*

Gostou? Quer ler mais textos da Dani? Conheça o livro “Amiga, coloque a calcinha para dentro da calça e outras conversas”, à venda na loja do Clube da Alice no Shopping Mueller.

Contabilista Clube da Alice

COMPARTILHE

ENVIE SEU COMENTÁRIO